Há tempos as pessoas não escreviam tanto quanto atualmente – em redes sociais, blogs, e-mails corporativos e pessoais, aplicativos em smartphones etc. Esse uso intensivo da palavra escrita traz a necessidade de um maior conhecimento da língua portuguesa, não apenas em relação à gramática, mas também no que diz respeito a estilo e clareza. Nesta entrevista, o jornalista e revisor Helio Cantimiro, autor do “Manual de Redação para Empresas”, publicação especialmente criada para o universo corporativo, lembra que, uma vez que redigido e enviado, o texto ganha caráter documental. Fica para sempre.
Na sua avaliação profissional, as pessoas se comunicam mais por escrito, no universo corporativo e pessoal, do que o faziam há 10, 15 anos?
Sem dúvida, e acredito que essa tendência vá se manter. A comunicação por escrito tem algumas vantagens, como, por exemplo, o custo mais baixo em relação às tradicionais ligações telefônicas. O Skype e outros aplicativos do gênero funcionam bem, mas, quando o tema a tratar é mais extenso, pode-se até perder agilidade com eles. Digo isso porque, apesar de ser preciso aguardar por um determinado período de tempo a resposta a uma mensagem escrita, esse tempo supostamente “perdido” acaba sendo empregado em outras atividades, o que pode ser ótimo em dias de homens e mulheres multiatarefados. Ao telefone ou por Skype, você fica “preso”, não consegue realizar mais nada naquele intervalo de tempo. E sempre existe a possibilidade de que a pessoa que se pretende contatar não atenda. Aliás, no caso específico do ambiente corporativo, esta é, para mim, uma vantagem clara da comunicação por escrito: você pode até não alcançar o destinatário, mas sua mensagem alcança, e isso fica registrado. O caráter documental das mensagens por escrito me parece muito importante dentro de uma empresa, e de certa maneira protege o profissional. Já no caso da comunicação pessoal, basta olhar para os “lados” e observar como crianças e adolescentes se comunicam hoje em dia. É Facebook, Twitter, WhatsApp etc.
Do ponto de vista da imagem pessoal, como acredita que erros graves de redação são percebidos por colegas, chefes, clientes, parceiros etc.?
O texto escrito tem caráter documental. Falou, está falado. E, para mim, a forma pode desqualificar o conteúdo. Outro dia, por exemplo, recebi um e-mail cujo assunto era “Corricúlo“. Joguei na lixeira sem ler. Até porque, com um erro tão grosseiro, achei que poderia ser vírus. Aliás, esses erros são um bom filtro antivírus. Sempre que me chega um e-mail com assuntos do tipo “Urgente: seu token está descincronizado” ou, o melhor de todos, “Intimassão urgente da Policia Federal”, eu deleto na hora. São exemplos extremos, mas dizem muito de como a forma contamina o conteúdo – a ponto de, às vezes, o receptor nem querer tomar conhecimento da informação que o emissor deseja lhe passar. E acredito que erros menos graves também podem comprometer.
E, no que diz respeito ao entendimento da mensagem, os erros mais comuns lhe parecem graves a ponto de prejudicar a compreensão dos textos? Citaria exemplos?
Não necessariamente os mais comuns, e não necessariamente os erros de português, mas os erros de estilo. Por exemplo: “Esse impacto, ocorrido no final do ano passado, somente agora, a partir de março, mês em que começou a valer a exigência, repercute nas empresas contribuintes, pois as contribuições mensais para a Cofins e PIS foram elevadas, em virtude do aumento de alíquota da Cofins de 2% para 3% e, como se não bastasse, também a alteração da base de cálculo da referida Cofins e do PIS, ‘incindindo’ (sic) sobre o faturamento mensal, assim considerado a receita bruta das vendas de mercadorias, mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza acrescido de valores outros como os oriundos de receitas financeiras e aquelas decorrentes da baixa do ativo imobilizado”. Toda a informação é despejada em um único período. No meio dele, você: já se perdeu; ou já desistiu; Então, em casos como esse, o negócio é botar ponto. Períodos curtos são a melhor opção em textos que trazem muita informação e/ou têm conteúdo muito técnico. Eles podem até ficar um pouco monótonos, mas os riscos de o autor se perder enquanto escreve e de o destinatário se perder enquanto lê diminuem bastante.
Acredita que a tendência à abreviação de palavras, muito presente na internet, veio para ficar?
Acredito. Mas é engraçado, porque textos com palavras abreviadas não vêm de hoje. Os telegramas sempre foram assim, por economia: quanto menos caracteres tinham, mais baratos saíam. Atualmente, acho que a opção pelas abreviações também tem um componente econômico. Só que a economia é de tempo. Outro componente, na minha opinião, diz respeito ao suporte. Em um tablet de 7 polegadas ou em um smartphone, por exemplo, com teclados bem pequenos, é mais confortável digitar menos. Além disso, a chance de cometer erros se torna menor.
Que recomendações faria, de maneira geral, para que as pessoas escrevam melhor?
Há que se ler. A dose recomendada é três vezes por semana. Se não der, porque a vida está corrida mesmo, duas vezes já valem. Mas leia livros, qualquer livro, de preferência de autores de língua portuguesa e de editoras conhecidas. Escrever é um treino como outro qualquer. Então, não deixe de treinar. Ler, praticar a escrita e, para terminar, duas dicas: consulte um dicionário em caso de dúvida (o Caldas Aulete on-line me ajuda um bocado) e, antes de clicar em Enviar, dê uma lidinha rápida no que escreveu.